Segundo as investigações da Operação Boca Livre, um grupo criminoso atuou por quase 20 anos no Ministério da Cultura e conseguiu aprovação de R$ 180 milhões em projetos fraudulentos. Boca Livre é uma expressão que significa festa onde se come e bebe de graça às custas de outras pessoas.
O desvio ocorria por meio de diversas fraudes, como superfaturamento, apresentação de notas fiscais relativas a serviços/produtos fictícios, projetos duplicados e contrapartidas ilícitas realizadas às incentivadoras.
Os donos da produtora Bellini Cultural e o produtor cultural Fábio Ralston estão entre os presos já encaminhados para a sede da Polícia Federal de São Paulo, na Zona Oeste da capital paulista.
A Polícia Federal concluiu que diversos projetos de teatro itinerante voltados para crianças e adolescentes carentes deixaram de ser executados, assim como livros deixaram de ser doados a escolas e bibliotecas públicas. Os suspeitos usaram o dinheiro público para fazer shows com artistas famosos em festas privadas para grande empresas, livros institucionais e até a festa de casamento de um dos investigados na Praia de Jurerê Internacional, em Florianópolis, Santa Catarina.
Além das 14 prisões temporárias, 124 policiais federais cumpriram 37 mandados de busca e apreensão, em sete cidades no estado de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. O inquérito policial foi instaurado em 2014, após a PF receber documentação da Controladoria Geral da União de desvio de recursos relacionados a projetos aprovados com o benefício fiscal.
A Justiça Federal inabilitou algumas pessoas jurídicas para impedí-las de apresentar projetos culturais no MinC e na Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo. Também foi realizado o bloqueio de contas bancárias e o sequestro de bens como imóveis e veículos de luxo.
Entre os alvos da operação, estão o Ministério da Cultura,o escritório Demarest Advogados, a empresas Scania, Roldão, Intermédica Notre Dame, Laboratório Cristalia, KPMG, Lojas 100, Nycomed Produtos Farmacêuticos e Cecil.
O escritório Demarest Advogados informou por meio de nota, que o objetivo da visita dos policiais "foi a solicitação de documentos e informações relacionados a empresas de marketing de eventos que prestaram serviços ao escritório no âmbito da Lei Rouanet". "O escritório enfatiza que não cometeu qualquer irregularidade, e informa que colaborou e continuará a colaborar com a investigação", diz a nota.
A empresa Roldão disse que contratou "a Bellini Eventos Culturais para a realização de dois show corporativos e que, na manhã desta terça-feira (28), teve que apresentar à Polícia Federal documentação referente a esses serviços". "A empresa informa que não é alvo da operação e que já entregou à força-tarefa todos os documentos solicitados. Por fim, reforça que está colaborando com a investigação, à disposição de todas as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos e que não admite qualquer tipo de irregularidade ou ilegalidade em suas atuações", diz a nota.
As demais empresas foram procuradas nesta manhã, mas até a última atualização desta reportagem não haviam comentado.
Os presos devem responder pelos crimes de organização criminosa, peculato, estelionato contra União, crime contra a ordem tributária e falsidade ideológica, cujas penas chegam a doze anos de prisão.
A Lei Rouanet foi criada em 1991, durante o governo Fernando Collor (PTC/AL). A legislação permite a captação de recursos para projetos culturais por meio de incentivos fiscais para as empresas e pessoas físicas. A Lei Rouanet permite, por exemplo, que uma empresa destine parte do dinheiro que iria gastar com impostos para financiar propostas aprovadas pelo Ministério da Cultura.
Laboratório
Segundo a PF, a Operação Boca Livre foi a primeira a utilizar o Laboratório de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro de São Paulo, que cruza milhares de dados e informações.
O laboratório será utilizado também na análise do material apreendido pela Polícia Federal.