Na última quinta-feira (8), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu autorizar prefeitos e governadores a fecharem templos religiosos em meio à pandemia de Covid-19. Nove entre onze ministros interpretaram que a interrupção dos cultos não fere a cláusula pétrea da Constituição no que diz respeito às liberdades individuais, e apenas os ministros Nunes Marques e Dias Toffoli se posicionaram a favor dos eventos religiosos.
O Pleno.News entrou em contato com lideranças evangélicas, a fim de conhecer as opiniões dos pastores acerca do assunto.
SILAS MALAFAIA
Líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, o pastor Silas Malafaia se posicionou contrário à decisão do STF e afirmou que a Corte é “negacionista da Constituição”. Ele disse que o Supremo tem ferido cláusulas pétreas da Carta Magna ao cercear a liberdade de expressão, o direito de ir e vir e o lugar de culto. Ele acrescentou que o STF tem causado uma “desordem e instabilidade jurídicas”.
– O Supremo Tribunal Federal, que virou o Supremo Ditador de Toga, deixaram de ser guardiões da Constituição para serem usurpadores da Constituição, negacionistas da Constituição. […] Quando uma Suprema Corte rasga a cláusula pétrea da Constituição, virou Ditadura da Toga, perseguição e ódio a religião.
Diante da decisão desta quinta-feira, o líder evangélico disse que o papel da Igreja é “orar e agir como cidadão”, mantendo as igrejas abertas dentro daquilo que é permitido em cidades, estados e municípios. Contudo, ele ressalta que, se não estivesse sozinho em seu posicionamento, gostaria de ver outros pastores e padres dispostos a abrir os templos, apesar das restrições.
– Sozinho não posso fazer nada. Se tivesse um monte de pastor e padre com raça e vontade de abrir igreja, eu queria ver o Supremo e quem quer que seja mandar prender. Sozinho, o que eu posso fazer? A única coisa que posso fazer, estou fazendo: me posicionar, peitar e enfrentar [isso] com a minha cidadania, orientando o povo, esclarecendo.
Malafaia destacou que as medidas de higiene são fundamentais para o funcionamento dos cultos e criticou a ideia de que os templos permitem mais contágios do vírus que outros locais.
– Se uma igreja é aberta e tem gente, lógico, tem que ter distanciamento social, álcool em gel, máscara, medidor de temperatura. Isso é mais do que nossa obrigação. Nós não estamos pedindo para causar desordem. Agora você vê ministro do STF insinuar que o lugar de culto causa mais Covid que transportes coletivos apinhados, onde os brasileiros passam 3 a 4 horas por dia é menos nocivo que a igreja. Isso é uma insanidade!
Por fim, ele ressaltou que a Organização Mundial da Saúde reconhece o poder terapêutico da religião e desafiou jornalistas a provarem que os templos religiosos são mais perigosos do que outros espaços.
MARCO FELICIANO
Pastor e deputado federal, Marco Feliciano (PSC) se posicionou contra a decisão do STF e a descreveu como característica de uma “ditadura branca”. O parlamentar, que é colunista do PlenoNews e presidente da Catedral do Avivamento, informou que membros da frente evangélica foram à Corte falar pessoalmente com ministros.
– O país amanheceu debaixo de ditadura branca. Religiões [foram] amordaçadas. Medidas mais duras que Estado de Sítio [foram] decretadas. Parlamento [foi] tutelado e [está] de joelhos. E tudo sob o manto do “mito da imparcialidade judicial”. Antes tivessem tanques nas ruas para que eu pudesse lutar contra eles! Como parlamentar membro da frente evangélica, posso afirmar, fomos ao STF. Falamos com ministros. Entregamos memoriais. Usamos a tribuna e as redes sociais.
Diante da decisão de liberar o fechamento dos templos, Feliciano afirma que denunciará o caso na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
JOSUÉ VALANDRO
O pastor Josué Valandro, da Igreja Batista Atitude da Barra da Tijuca (RJ) e líder religioso da primeira-dama Michelle Bolsonaro, defendeu que o cerne da questão não está na teologia, mas na Constituição. Ele considera que o STF “ignora o texto constitucional” e o “adequa à sua ideologia”.
– Algumas pessoas do meio evangélico ficam dizendo que nós temos que lembrar que somos Igreja de Cristo em qualquer lugar, que nós somos templo do Espírito Santo etc. O problema aqui não é esse. O problema não é teologia, é a Constituição. A Constituição garante o direito de culto. É inviolável. Está na nossa Constituição, no artigo 5°. Então, não podemos infringir. Só que o STF, mais uma vez, ignora o texto constitucional e adequa à sua ideologia. E isso é um absurdo! Quer alterar a Constituição? Altere. Mas você não pode ir contra ela numa cláusula pétrea. É isso que nós estamos reivindicando.
O líder evangélico estendeu a crítica não apenas no que diz respeito à decisão dos cultos, mas também a julgamentos anteriores da Corte.
– É um absurdo, e não é a primeira vez que o Supremo faz isso. O Supremo não tem votado as coisas em função da Constituição, mas em função de sua ideologia, de seus pensamentos, de seus objetivos.
Valandro frisou ainda que a decisão afeta não apenas a comunidade evangélica, mas religiões de todos os tipos.
– Isso afeta a Igreja. Isso afeta todas as religiões. As pessoas estão esquecendo que não se trata da questão do evangélico. Mas isso afeta a Igreja Católica. Está afetando qualquer reunião espírita. Está afetando qualquer budista. Todas as religiões. O direito de crença e de culto está sendo violada pelo Supremo.
ABNER FERREIRA
O bispo Abner Ferreira, da Assembleia de Deus – Ministério de Madureira (RJ), acredita que o STF tenha errado ao conceder autoridade a estados e municípios para fecharem as igrejas e afirmou que o evangelho continuará a ser anunciado.
– A Igreja jamais recuará. A Suprema Corte Celestial já deu a ordem de avançar. A decisão será obedecida, e o evangelho continuará a ser pregado.
Abner declarou que, embora os decretos devam ser respeitados, a Igreja deve continuar com a missão de compartilhar a Palavra de Deus com o mundo.
– Devemos continuar com a nossa missão de pregar a Palavra de Deus, buscando meios para respeitar os decretos, mas sem recuar.
Ele citou ainda uma das falas de Jesus, registrada no Evangelho de João (15:19).
– “Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas, porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos aborrece”.
ANDRÉ CÂMARA
Pastor da Assembleia de Deus em São José dos Campos (SP), André Câmara acredita que falta equilíbrio na preservação dos direitos. Ele afirma que há meios de garantir tanto o direito à vida, à saúde e à liberdade de culto.
– Eu acho que nós estamos no meio de uma grande crise de equilíbrio, porque se fala muito em preservar direitos primeiro. Direito à vida, direito à saúde e o direito de livre culto, que são preservados pela Constituição tanto quanto qualquer outro direito. O grande problema é que não estão sabendo equilibrar os direitos. A minha colocação é que há, sim, possibilidade de você equilibrar todos eles, fazendo parâmetros para que sejam preservados.
Câmara defende os cultos presenciais, mas destaca a necessidade dos protocolos de prevenção contra a Covid-19 nas reuniões.
– Pode ter culto presencial? Sim, dentro dos seguintes parâmetros: distanciamento, nem que seja 10% da capacidade, o dízimo da capacidade do templo. Mas você está preservando o direito das pessoas de cultuarem, que é protegido pela Constituição, e ao mesmo tempo dando a elas o direito do resguardo à saúde. […] Eu acho, sim, prudente evitarmos grandes aglomerações ou cultos com muita gente durante o tempo de pico da pandemia.
Câmara criticou o posicionamento de alguns ministros do STF, citando parcialidade, e um suposto esforço para fechar as igrejas.
– Dizem que as igrejas são os locais onde as pessoas mais se contaminam. É uma mentira. Quando você atrela uma fala equilibrada, ponderada, com uma frase totalmente desequilibrada dessa, você vê que estão sendo parciais, estão querendo fechar as igrejas. Pode ter supermercado, pode ter transporte público? Por que não pode ter igreja dentro dos parâmetros de números de pessoas?
Ele também frisou a importância da fiscalização dos templos, para que as medidas sanitárias sejam cumpridas.
– Liberem e fiscalizem. […] Se o problema é que está “dando” muita gente, então fiscaliza. O problema é da fiscalização também.
RENATO VARGENS
O pastor Renato Vargens, da Igreja Cristã da Aliança, em Niterói (RJ), comentou sobre cristãos que apoiam a proibição das reuniões presenciais de missas e cultos em tempos de Covid-19. Ele acredita que isso se deva a um “desentendimento” do que “de fato estava sendo defendido por aqueles que lutam pela liberdade de culto”.
Vargens, que também é colunista do Pleno.News, negou que as pessoas que defendem as reuniões religiosas sejam a favor de aglomerações, mas declaro que elas defendem o ” direito constitucional de reunião”.
– Em nenhum momento por exemplo, foi defendido aglomerações ou mesmo reuniões sem regras ou limitações sanitárias. Muito pelo contrário! As igrejas, comprometidas com o bem comum, zelam pela saúde da população seguindo protocolos de biossegurança.
Ele argumentou que o fechamento de uma igreja não cabe ao Estado, mas sim à congregação em particular. Considera ainda a funcionalidade da Igreja como “fundamental” em meio às crises.
– Aqueles que defendem a liberdade de culto entendem que a funcionalidade da Igreja de Cristo é fundamental a um mundo em crise, visto que a Igreja tem o papel de socorrer, acolher, consolar, confortar e ministrar o poder do evangelho àqueles que sofrem.
CÉSAR AUGUSTO
Líder da Igreja Fonte da Vida, em Goiânia, o apóstolo César Augusto também considerou a ação inconstitucional, mas ressaltou que a “maioria dos evangélicos é contra aglomeração”.
– Nós, mais do que ninguém, ensinamos que a Igreja precisa andar de acordo com as normas da Organização Mundial da Saúde. Os decretos que foram com relação à limitação da presença das pessoas no culto têm que ser respeitados. Há algumas igrejas que não fazem isso. Essas deviam ser punidas.
Ele frisa, porém, a importância da Igreja para a sociedade e descreve a ação do STF como “ditatorial”.
– Só uma Igreja que está executando o que a Palavra de Deus diz, e o culto presencial faz parte dessa normalidade, vai poder ajudar as pessoas que estão depressivas, em pânico… pensando em tirar a sua própria vida; pessoas que estão passando necessidades, que precisam de uma cesta básica, que precisam de um apoio. Só o culto presencial pode gerar novamente esperança e fé no futuro que o próprio Deus pode dar a essa pessoa.
Ele espera que as autoridades do Judiciário e do Executivo repensem as medidas, sob o risco de o país entrar em uma crise ainda maior. O apóstolo assinala ainda que não é apenas contra o fechamento dos templos, mas também o lockdown.
– É lógico que eu sou contra o lockdown, porque o lockdown, além de colocar você dentro de uma caverna, e ali sua imaginação ser dirigida por uma mídia sensacionalista (e eu não estou fugindo da realidade das mortes; ela existe sim; isto acontece, mas a maneira como é noticiada gera um pânico nas pessoas), nós vamos ter uma crise econômica maior do que já estamos. As pessoas perderam os seus empregos, pedindo falência; famílias estão desassistidas em todas as áreas. Então é o momento de reconsiderar – defendeu.