Dados do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), já colocam 2024 como um dos anos com maior quantidade de focos de queimada na última década. Setembro já contabilizou mais de 80 mil focos, cerca de 30% acima da média histórica, registrada desde 1998 pelo Inpe. Mesmo que a quantidade de focos não extrapole as médias históricas nos últimos três meses do ano, 2024 terá o maior número de focos desde 2010, quando o Brasil teve 319.383 registros.
Os dados indicam que essa média pode ser superada, pois o mês de setembro teve aumento de 311%, passando de 18 mil focos em 2023 para 75 mil em 2024.
Centro-Oeste puxa altas
O levantamento do Inpe indica aumento consistente nos focos em todas as regiões do país, em relação a 2023, com destaque para o Centro-Oeste, que teve três unidades com mais aumentos neste ano: Mato Grosso do Sul, com 601% e 11.990 focos em 2024; o Distrito Federal, com 269%, ainda que com apenas 318 focos; e Mato Grosso, 217%, com 45 mil focos, tornando-se o estado com o maior número no país neste ano, ultrapassando o Pará. Os números em Mato Grosso são mais fortes em setembro, quando foi responsável até agora por 23,8% dos focos do país ou 19.439 registros. O Pará também teve grande quantidade de queimadas no mês: 17.297 focos, ou 21,2% de todos os registros.
Completam o ranking dos maiores aumentos dois estados do Sudeste, com números totais de queimadas menos representativos, porém com grande aumento: São Paulo e o Rio de Janeiro. O aumento para os paulistas foi de 428% em setembro, com 7855 focos ativos. No Rio, foi de 184%, ou 1074 focos.
Em São Paulo, grande parte dos focos esteve concentrada em setembro, quando o estado registrou 2.445 focos ativos, 3% das ocorrências em todo o território nacional. Nas últimas 48 horas, o estado registrou 65 focos ativos, de acordo com o Inpe. A Defesa Civil estadual informou que quatro municípios registraram focos nesse domingo (29), entre eles Luiz Antônio, na região de Ribeirão Preto, onde o combate se concentra na Estação Ecológica do Jataí. Somente lá atuam 133 agentes, entre defesa civil, bombeiros, brigadistas e voluntários. São 42 veículos, entre caminhões pipa, tratores e camionetes 4×4. Usinas da região uniram-se à força-tarefa enviando brigadistas e veículos de apoio. Seis aeronaves, sendo quatro aviões e dois helicópteros, também foram mobilizados nessa frente.
Desde o começo das medições, o país teve mais de 300 mil focos apenas em seis anos: 2002, 2003, 2004, 2005, 2007 e 2010. Neste ano de 2024 caminha para a volta dessa marca. Com seus 208 mil focos registrados, está atrás somente dos totais de 2020, com 222.797 focos, e 2015, com 216.778, considerando apenas os últimos dez anos.
A disputa eleitoral em cidades de médio e pequeno porte do Brasil virou uma “guerra de números”, com base em supostas pesquisas que apresentam resultados para todos os gostos. Em determinados locais, a quantidade de levantamentos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) chega a ser maior do que a de capitais e outros municípios maiores.
Em Picos (PI), cidade que fica a 318 quilômetros de Teresina, existem versões bem distintas de pesquisas sendo utilizadas pelos candidatos. O atual prefeito, Gil Paraibano (PP), disputa a reeleição, numa briga direta com o deputado estadual Dr. Pablo Santos (MDB). Ambos possuem publicações nas redes sociais com resultados de levantamentos que os colocam na dianteira.
A cidade de 83 mil habitantes é a 25ª do país com mais registros de pesquisa no TSE. Até a quinta-feira (26/9), eram 28, a mesma quantidade de Salvador (BA) e Curitiba (PR), e mais do que capitais, como Porto Alegre (RS), Vitória (ES) e Florianópolis (SC). Enquanto Paraibano diz liderar com mais de 40% das intenções de voto, Dr. Pablo usa pesquisas que o colocam com mais de 60%.
PT contra PL
Essa disputa acalorada e com diferentes versões numéricas é verificada, também, em Anápolis (GO), cidade de porte médio, com quase 399 mil habitantes, mas que chega a ter mais pesquisas do que o Rio de Janeiro (RJ). A corrida local reflete a polarização nacional. Os dois candidatos mais bem colocados são Antônio Gomide (PT) e Márcio Correa (PL).
O município já contabiliza 42 pesquisas, enquanto Rio de Janeiro e Fortaleza, por exemplo, têm 37 e 36, respectivamente. A briga entre PT e PL na cidade goiana virou uma disputa numérica, na tentativa de gerar influência e aumentar o otimismo das bases eleitorais. Por ter mais de 200 mil eleitores, Anápolis está sujeita a ter segundo turno.
A quantidade de levantamentos registrados, até então, nas eleições deste ano, já é a maior da série histórica. Na quinta-feira, o sistema do TSE informava um total de 10.789, e na sexta (27/9) chegou a 11.440, o maior número desde 2012, quando o Tribunal passou a contabilizar e divulgar dados de pesquisas eleitorais.
A presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel), Mara Telles, é crítica à proliferação e ao uso de pesquisas com metodologias questionáveis para tentar influenciar o eleitor. Ela reconhece que há no Brasil bons institutos, que fazem um trabalho sério e que seguem as regras de amostragem, mas afirma que existem aqueles que fazem o contrário.
“Não é exatamente uma guerra numérica. É uma guerra baseada em desinformação. A desinformação virou um grande negócio e tem muita gente lucrando com isso. Existem vários pequenos institutos que estão por aí, que as pessoas não conhecem e que têm vendido fantasias para os candidatos. São institutos que fazem negócios em troca de resultados, muitos surgidos às vésperas das eleições”, aponta Mara.
Na sexta, o valor total investido em pesquisas, nas eleições deste ano, ultrapassou os R$ 120 milhões — exatamente R$ 124,3 milhões. Essa quantia é a maior das eleições municipais, desde 2012. “É muito dinheiro, e boa parte vem do Fundo Partidário. Está sobrando dinheiro. Vale dizer que institutos pequenos fazem muita pesquisa a custo baixíssimo, com pessoas não treinadas”, diz a presidente da Abrapel.
No “vale tudo” numérico das eleições de 2024, já surgiu de tudo — de gráficos manipulados a somas de percentuais que não atingem os 100%. Com o status de peças de marketing, principalmente numa eleição que já resultou em mais de R$ 120,4 milhões gastos em impulsionamento de conteúdos digitais, as pesquisas viraram armas estratégicas das campanhas em todo o país.
Em Parnamirim (RN), a disputa entre Professora Nilda (Solidariedade) e Salatiel (PL) não para de gerar novos números e publicações na internet. A cidade é a 17ª do Brasil com mais pesquisas registradas, até então. Ao todo, são 33 levantamentos, mais do que capitais como Curitiba, Recife, Salvador e Porto Alegre.
“As pesquisas são eventos de campanha e existem cidades com resultados muito distintos. Eu mesma vi uma com três institutos e três resultados completamente diferentes. Mesmo que uma pesquisa seja dada como falsa, ela já foi publicada, já foi dada como verdade e utilizada pelas campanhas. Além de desinformar, isso influencia, pois o que mais existe é aquele tipo de eleitor que quer votar em quem está na frente”, alerta Mara Telles.
Nilda aparece na frente na maioria das pesquisas. Só nas últimas semanas, o perfil dela no Instagram fez sete publicações com vários percentuais, de 38,7% a 58,3%, conforme levantamentos de diferentes institutos. “Nilda segue crescendo, e o candidato do prefeito está ficando cada vez mais para trás”, diz o texto provocativo de uma das postagens.
O tal “candidato do prefeito” é o jornalista e redator Salatiel. Para reagir e contra-atacar a investida numérica da adversária, ele fez duas publicações recentes, nas quais os gráficos dão a entender, visualmente, que ele está na frente. Os números das pesquisas utilizadas pelo candidato, no entanto, indicam o oposto: ou ele está atrás ou empatado. “Ninguém segura o homi!”, diz um dos textos de destaque.